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Mostrando postagens de setembro, 2017

a noite que pousa no homem

acho que tenho andado muito perdido, por um momento as coisas pareceram tão tênues, o caminho foi ficando tão pequeno, foi ficando difícil respirar, tudo parecia estreito, eu mesmo não cabia mais nem sei, com certeza se estava ali ou se estava, quem sabe, expondo meu corpo ás infinitas pombas no beiral da janela em troca de um pedaço, um farrapo qualquer de alguma coisa que fizesse sentido e não faz, as vezes parece que clareia, mas é sonho, um momento antes do furacão. um segundo e estamos aqui, presos num céu intergaláctico de estrelas que despencam, envoltos por uma coisa escura como uma capa que agarra o corpo da gente, suga nosso ar, parece que você some aos poucos dentro da bruma e que tudo é tão distante e longe e dói. mas você sabe né que de alguma forma você vai viver, se permite até ter alguma esperança, uma pequena bituca acesa enquanto a cidade inteira dorme. ou finge. e as palavras rolam por seus caminhos ocultos através da veia abe

um recorte sobre esperança

eu que desenhei a paisagem para os teus olhos ciganos e que de alguma forma meio sem querer percebi teus pequenos deslizes não te julgo, nem te acolho mais que o suficiente para encostar na tua boca palavras grandiosas sobre o futuro do mundo e de como você não está só, mas está e você sabe. todos estamos. você e eu que somos muitos outros em nós que tentamos sobreviver inteiros ao grasnar dos corvos ao meio-dia, que sentimos aquela onda quente como um bafo azedo e amanhecido subindo pelo asfalto e os carros e as próprias aves negras em pleno vôo choram e lamentam por nós, eu suspeito. e tremo. você mais do que eu inventou um jeito mais bonito de não se sentir só um esquema quase infantil de sentir-se grande e conectado com as coisas de fora e as angustias do mundo. uma forma de também olhar para dentro. talvez acho que até você tem dias chuvosos e raios furiosos na cabeça, pois te vi tão triste hoje pelos corredores e eu quis mesmo acreditar

afirmações amorosas

será todo dia uma festa desde que você fique que percorra os corredores elétricos com suas pressas urgentes e olhos doces, que nossos atrasos conhecidos não nos alcance só para nos perdemos de novo. desde que ocupe seu lugar na poltrona vazia logo a frente e que preencha de riso o silêncio das coisas que murcham e se desintegram no instante depois do ato será todo dia uma corrida algo como esticar os joelhos só que diferente um tipo diferente de aventura na selva um jogo perigoso, todo dia será um dia de descoberta porém desde que você fique.

cântico vermelho

por onde andam aqueles querubins amados com suas espadas afiadas e seus gemidos? por onde andam os marinheiros errantes de leitos quentes e esparsos? será que cruzam os montes enquanto os persigo em sonho? será que entendem meu desespero e minha luta e ainda assim se demoram? será que existem tais homens sobre a terra? homens capazes de me transcender o espírito será que me acharam vulgar ou velho demais para lhes satisfazer a ânsia do ato? o que será que será desses homens e de mim, que feito um lobo no cio os persigo? mas o que será feito da primavera quando o verão retornar?

fragmento sobre o nascimento das coisas

eu queria que as casas tivessem varandas e fossem lares desses que humanizam as pessoas, que amolecem a gente eu queria que as construções homenageassem a forma e a esperança com que os abraços são feitos eu queria as sutilezas da lingua do lábio do sorriso eu queria que eles todos arrancassem as roupas que fossem todos tocados pelo anjo nu e travesso, provassem o sabor e a consistência de sermos nós mesmos da melhor forma que conseguimos.

aquilo que um dia foi rosa

é que as rosas resolveram fechar-se em suas pétalas e os rios dedicaram-se a correr pelas cidades e a vasculhar os extensos quilômetros de pele que nos separa apenas pela fagulha da possibilidade de desaguar entre tuas valas ou comer do seu riso um rastro forte, um rangido, algo que traça na fronte subitamente uma linha, um mapa geográfico da sua espessura, uma gruta escondida na escuridão é que o sangue que corre nas veias que te compõem um cenário de treva tetas e fossas, até que te arranca o dente é o mesmo tombo fruto daquilo que se esconde nas entranhas, no breu e no casulo bruto da rosa é o engano por certo é o engano da flor que produz aquela coisa amarga e recolhida é o engano que chama a si mesmo por pequeno milagre e implora enquanto chora um pranto seco pelo deserto, dispara um lamento largo e agudo repetindo alto apenas como um mantra, como um ato de fé, de misericórdia, que repousassem suas raízes

encontros que ficam

hoje é mais um dia que nos esticamos um sobre o outro, a lua, o poste e os gatos nos observam atentos do nosso interior, disseram que há alguma mediunidade nos gatos, uma estranheza típica de quem olha pra dentro, não sei, com certeza existe um certo olhar de quem revela, de quem entrega o jogo, talvez até entregue mesmo, mas não hoje que nos olhamos de perto e que eu conheci aquela sua pinta nas costas, não hoje enquanto nos enroscamos e nos ajeitamos pela quinta vez naquele mesmo banco duramente cinza e penso no meio da praça, não enquanto a cidade toda silencia suas trombetas de serafins tristes e mudos, não na nossa praça íntima a praça de ontem e anteontem e de semana passada de novo o mesmo banco e nós que já não somos os mesmos, mas que ainda permanecemos meio verdes e trêmulos mal imaginamos a fundura do poço um do outro, que ali escancarados e desprotegidos sobrevivesse de alguma forma uma semente algo como esperança um futuro bon